Adolescências grisalhas

 


 

Naquele dia, estava entrando estrada afora com mais cansaço do que nunca. Havia passado dias muito corridos com compromissos no trabalho e pessoais que me impediam de relaxar como era devido. Encostei-me na janela do ônibus e decidi que dormiria durante todo o trajeto.
Não contava que teria uma companhia. 

Com longos cabelos cacheados que iniciavam a se tornarem prateados, uma senhora no início de sua terceira idade. Os olhos claros, levemente escondidos por profundos óculos, percorriam a estrada como quem nunca havia percorrido aquele caminho. Aproveitava os intervalos dos cochilos da sua companheira ao lado para perguntar alguma informação da cidade na qual iria.

E a companheira, infelizmente exausta, pouco dava atenção. Até que em determinado momento, resolvi ter uns dedos de prosa com aquela senhora que ansiava por conversa e perguntei sobre o motivo de estar indo a uma cidade desconhecida. Para minha surpresa, ela iria se encontrar com um “paquera” que conheceu pela internet. 

Meu sono dissipou como nuvem em dia ensolarado. Repassou pela minha cabeça todos os perigos que poderiam ocorrer em tal encontro. Aquela senhora fofa que estava ao meu lado, que provavelmente orientava os filhos a não conversarem com estranhos, indo feliz e sorridente para uma aventura que lhe custou mais de 24 horas de estrada. 

Na minha mente, apenas adolescentes deveriam ter tais ideias. 

Curiosa por conhecer a história, passei o restante do caminho ouvindo os detalhes que nem os filhos sabiam, afinal, eles não a deixariam vir. Nome do paquera, profissão, com quem morava, o que estava programado para fazerem. Tentei gentilmente, como fazemos com desconhecidos, apresentar possíveis perigos pelos quais poderia passar. Mesmo assim continuava segura da decisão. 

Ao chegar ao seu destino, agradeceu a conversa, pegou sua bolsa e saiu. Iria pegar a mala e ligar para o “paquera” ir buscá-la na rodoviária. Eu a deixei contente por poder compartilhar com alguém sobre sua aventura e ela me deixou preocupada durante o restante do caminho. 

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Na minha viagem de retorno, fiz da mesma forma. Encostei minha cabeça na janela e dormi durante todo o trajeto. Em determinado momento, ouvi um senhor pedindo informações a outra passageira. Ele não era daqui e queria chegar a determinada cidade. Motivo: encontrar um amigo que conhece há anos pela internet. 

Não era possível que a cena se repetisse. Abri meus olhos, olhei bem para o novo aventureiro. Parecia ter mais idade do que a primeira senhora, já que agora os cabelos estavam completamente brancos parcialmente cobertos por um boné. 

Ao ouvir a motivação, outra passageira também se espantou e disse que ele estava parecendo adolescente. Ele riu, encostou sua cabeça na poltrona, feliz pela comparação. Fizemos o mesmo. Recostamos nossa cabeça. Felizes? Não. Preocupadas!

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