Só sai quem se pesar


Na porta da farmácia esperava no carro, enquanto ele ia em busca do alívio da dor. Três pessoas saíam, uma por vez. Mas antes, a balança. A minha primeira observação foi a mulher de jaqueta, um pouco acima do peso. Na mesma situação que ela, torci de longe pra que tivesse visto algo bom. A careta denunciou que não.

Uma mais baixa também conferiu e em seguida o homem do grupo. Pensei "homem não liga pra essas coisas". Lá foi ele subir o terrível degrau, desta vez, uma reação indiferente, como todos os outros homens que subiriam na balança naquela noite.

Um grupo entrava enquanto o outro saía. E ele ainda buscando pelo alívio da dor. Ventava frio lá fora e lá vem outro rapaz de jaqueta. Vinha saindo com uma sacola, mas antes, a subidinha no degrau.

Lá se foram mais 2, 3, 4, 5 pessoas que, como um ritual, conferiam a massa antes de sair da farmácia. Nenhuma sorriu. Talvez por ela estar tão acessível e estratégica ao lado da porta, talvez por uma curiosidade mesmo, todas as pessoas que saíam, se pesavam.

Comecei a analisar a busca pelos padrões de beleza, a necessidade pelo corpo "perfeito", ou simplesmente a prática inconsciente de se pesar, o automatismo ao ver uma balança e fiquei intrigada. Imaginei o atendente avisando "-Só sai quem se pesar!". Fiz uma aposta comigo: "Todo mundo pesa, mas ele não é todo mundo. Ele não vai pesar".

Com tanta gente subindo e descendo, nem me dei conta que ele demorava demais pra comprar um remédio, mas lá vinha ele. "É um cara diferente, decidido, de bem consigo, seguro. Vamos lá, você consegue sair desse lugar sem subir nesse degrau. Chega de se submeter aos padrões socia..."

Não deu tempo de eu terminar o discurso mental. Ele e a sacola com o remédio já estavam em cima do objeto, olhando com um ar curioso o ponteiro subir. "Meu mundo caiu".

Ao chegar no carro, eu impressionada com tanta análise em pouco período de tempo e ele feliz e inocente sem saber de toda aquela observação, comenta: "pensei que estivesse mais gordo".

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