Jovem. Negro. Pobre e sem estudo. Esse é perfil majoritário dos 127 mil detentos que compõe a superpopulação carcerária no Brasil. Essa realidade também se reflete em Mato Grosso, que comporta cerca de 12 mil presidiários de maneira desumana. O jovem R.B., por exemplo, preso na Penitenciária Central do Estado (PCE) divide a cela de 12m² com outras 40 pessoas. Segundo ele, somente um dos raios comporta 300 pessoas. Esse número é equivalente a toda a capacidade do Centro de Ressocialização de Cuiabá (CRC) que atualmente possui 1200 detentos.
Segundo dados da Secretaria de Justiça e Direitos Humanos (Sejudh/MT), em Mato Grosso a população carcerária flutua entre 11.300 e 11.800 detentos. As principais motivações das condenações são referentes a furtos e roubos, tentativas de homicídio e violência contra a mulher. Nos presídios que possuem alas femininas, a Sejudh declara que 90% das prisões são referentes ao tráfico de drogas. Dentre os quase 12 mil presidiários, 1.130 são mulheres e se encontram na Penitenciária Feminina Ana Maria do Couto em Cuiabá, na Cadeia Pública de Rondonópolis (km de Cuiabá) e na Cadeia Pública de Cáceres (200 km de Cuiabá).
A população carcerária em Mato Grosso é maior que o número de habitantes de cidades como Dom Aquino (8.131 habitantes), Nossa Senhora do Livramento (11.592 habitantes) e Jangada (7.696). Os detentos estão lotados em 54 cadeias públicas, seis penitenciárias e uma colônia agrícola. A superlotação é um dado comprovado pela própria Sejudh. A assessoria de imprensa reconhece a precariedade do sistema, mas não disponibiliza nenhuma solução para o caso.
Segundo o Sindicato dos Servidores do Sistema Penitenciário de Mato Grosso, 26 reformas precisam ser feitas urgentemente nas unidades prisionais. Para isso, são necessários investimentos na ordem de R$ 10 milhões. Inclusive a interdição de algumas cadeias. O orçamento do Estado somente supre 1/4 do necessário, o que torna a reforma urgente como meta impossível.
A re-educação
A superlotação é presente em todos os presídios de Mato Grosso. No Centro de Ressocialização de Cuiabá, por exemplo, a única ala que não sofre com o problema é a área conhecida como “ala dos trabalhadores”. São 128 detentos, somente quatro por cela. Na área privilegiada possui enfermaria, estúdio de música, fábricas, marcenaria, serralheria, entre outras atividades que são remuneradas. Os detentos que são transferidos para a ala recebem mensalmente 1/3 do salário mínimo, trabalhando 8h por dia, além de comercializarem salgados, sucos e artesanato. Uma árvore de 15 cm de altura, feita com jornal e tinta é vendida a R$15, por exemplo.
Segundo a educadora responsável pelo projeto, Alvair Maria Barbosa, o dinheiro arrecadado é destinado ao próprio Centro. Porém, há denúncias de corrupção por trás dessa ação social. A área destinada a 130 presidiários, na unidade II, é a mesma ocupada pelos 500 detentos de uma das alas na unidade I. É questionável a seleção de 10% dos presidiários para ocupar uma área destinada a 40% dos detentos em regime normal. Além disso, presos da unidade I alegam que a consulta com a psicóloga é uma fachada. “Lá funciona assim, se você quer ter mais liberdade que os outros têm que pagar [...] Tem um colega meu que cometeu homicídio, pagou R$2.000 pra reduzir pena e hoje tá (sic) solto”, afirma o detento W.T.
Um dos reeducandos da ala dos trabalhadores, “a privilegiada”, entrevistados por esta equipe de reportagem, por exemplo, é graduado em Administração de Empresas. O detento G. A. está preso pela segunda vez, por tráfico de drogas e afirmou que no crime já chegou a receber 200 mil reais. Com boa aparência, o detento de 40 anos possui a perspectiva de abrir uma empresa de taxi aéreo após a saída da prisão. Expectativas bem diferentes se relacionadas aos planos para o futuro do detento R.T., da unidade “normal” da PCE. O jovem preso por furto afirma que já ganhou muito dinheiro com o crime. Quando questionado o valor, ele fala todo orgulhoso “ já ganhei muita grana [...] uns 2 mil contos”.
As atividades realizadas dentro da unidade prisional são realizadas por meio de parcerias com outras entidades relacionadas ao Governo. Os eletrodomésticos que são consertados pelos detentos que trabalham na área de refrigeração são enviados pela Secretaria de Estado de Educação (Seduc/MT). O montante de papel separado é encaminhado para a reciclagem pela empresa Via Verde, ligada ao Governo do Estado.
Um dos motivos pelo qual a ressocialização seja tão desejada pelos detentos é a redução de pena. A cada três dias trabalhados, um dia é remido. Mas apesar de possibilitar uma nova vivência aos detentos, a iniciativa ainda não é suficiente para resolver os problemas do país.
Talvez seja melhor estimular uma re-educação em casa.
[Matéria escrita em 2012... E tão atual.]
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