Aos 95 anos, meu avô de vez em quando cambaleava no quintal e
rapidamente encontrava um lugar para escorar seu corpo magro, mas pouco
debilitado. Ao ser questionado se era tontura, ele discordava. “As pernas que
estão trôpas”. A adolescente questionadora ainda retrucava. “Vô, o que é
trôpa?”. “Trôpa é trôpa. Quando você fica velho ‘as perna’ (sic) fica trôpa e
pronto”.
Em alguns dias a perna estava boa, mas ele não escutava
direito o que a gente falava. Era porque o ouvido “tava com zuada”. “Mas vô, o que é
‘zuada’?”. “Zuada é uma zuada forte menina, que perguntação”. Limpávamos o
ouvido e ficava tudo certo, mas ele não conseguia enxergar de longe, porque os
olhos ficavam “meio assim” (explicação dada com a ajuda de um movimento das
mãos), que deveria significar embaçado. A cirurgia para catarata melhorou.
Apesar da dificuldade em se expressar, a situação era
compreensível. Não sabemos até que série cursou na escola, ou se sequer
frequentou. Os únicos sinais que dava era uma escrita lenta e uma leitura
igualmente complicada. Mesmo com a falta do estudo, teve uma sabedoria
fantástica para guiar a família, comprar um terreno que pudesse se tornar
herança, e orientar a única filha a estudar.
Meu avô não se importava com o jeito certo de pronunciar o
que sentia. A obrigação de identificar os problemas de saúde por meio dos
sintomas era do médico, independente se a primeira queixa era “trôpa” ou “peleumonia”.
Se teria que fazer “raôxis” ou algum exame para ver o que seria essa “zuada” no
ouvido.
Ao paciente somente cabia a força de vontade para procurar
ajuda. Ao médico, a humildade para atender.
Post baseado nessa história:
Muito bom!
ResponderExcluirParelha a Quem me ajudaatraduzir?
Na PáginaMetidoapoeta.